quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Hoje no Rio



Hoje o nosso presidente veio até a Mangueira inaugurar uma nova quadra de esporte e cultura, onde disse em entrevista que em sua opinião, os criminosos são pessoas "anormais". Pois é, senhor presidente, nossas políticas parecem não só privilegiar a elite, mas também paralelamente (ou não) a exclusão. E somando isso aos séculos de regime escravocrata que o Brasil carrega, interrompido mas que ainda desfila suas cicatrizes diariamente à todos os olhos atentos, essa "anormalidade" que criminosos [?] possuem é quase que patológica. Isso não é uma defesa, é só uma constatação.

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"O adolescente Rafael Rocha Ribeiro, 15 anos, foi enterrado na tarde desta quinta-feira no Cemitério de Irajá, na Zona Norte do Rio. O jovem foi morto com um tiro de fuzil na cabeça na manhã de quarta-feira, durante confronto entre policiais militares e traficantes no Complexo de Manguinhos, na Zona Norte do Rio."

Texto e imagem: Jornal O Dia/Dia Online

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sábado, 24 de outubro de 2009

Distrito 9



"Distrito 9" é uma boa surpresa nesse ano, e principalmente, é uma boa surpresa pra ficção científica feita nos últimos anos. As alegorias que ele abre, tecendo paralelos entre os alienígenas e os próprios humanos (não se resumindo apenas ao "Apertheid", como alguns disseram), são bem inteligentes. Só o fato de ter uma favela formada por "Et's", a maneira como os mesmos são tratados pela sociedade, e a estética documental mesclada à ficção, fazem de "Distrito" um filme que vale a pena ser assistido. E se não tiver uma continuação, aquele final vai possivelmente dar mais ainda um status meio "cult" ao longa.    

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

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Andrea Beltrão realmente poderia sustentar um papel de protagonista numa novela das oito (ou das nove). É um exemplo de atriz que acredita e se entrega aos papéis que faz. Curioso que ela fez dois filmes com temáticas bem parecidas no último ano: "Verônica" e o mais recente "Salve Geral". O que me surpreende é o fato desse último ter sido o escolhido para representar o Brasil numa vaga pelo Oscar. Absolutamente nada contra tratar da violência no Cinema, muito pelo contrário, mas isso os cineastas brasileiros já fizeram outras vezes de forma excepcional, principalmente no campo do documentário, e não foram agraciados com tamanho valor.

Ainda acho que o melhor longa nacional de 2009 é o documentário "Corumbiara", até então injustiçado no circuito, o que tira a grande oportunidade das pessoas assistirem a esse belíssimo trabalho, que é tremendamente humano e brasileiro. É uma pena, pena mesmo, que a obra de Vincent e do Marcelo não chegue as salas de Cinema.  Devia ser uma obrigação do Minc que esse filme fosse exibido. Quem sabe, ainda tem estrada pela frente, eles podem conseguir.

E algo me diz que "Viajo porque preciso, volto porque te amo", que infelizmente não vi, seria o mais indicado àquela tal vaga.

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"UP" realmente é impressionante. Muito, muito bom. Um dos melhores filmes de 2009, eu aposto. E tem gente que ainda acha que animação é coisa só de criança.

Bem, as da Pixar não são.

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Por fim, "Bastardos Inglórios" é mais um presente do Tarantino ao Cinema. O único compromisso dos filmes do diretor, é com a própria sétima arte. Ou seja, é Cinema pelo Cinema; um Cinema que homenageia a sua própria arte. "Bastardos Inglórios" é praticamente um desfile de homenagens [cenas] à arte fílmica. Cada momente ali parece ser uma declaração de amor ao poder dos filmes e a arte de fazê-los. Ou seja, assistí-lo é o equivalente a comer um pavê de chocolate suíço: é delicioso. Mas ainda melhor.


quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Goodbye Solo




Um dos principais motivos que afasta o grande público dos filmes europeus, latinos, e até brasileiros, se concentra no fato da maior parte do Cinema feito nessas regiões ter um ritmo diferente do padrão monopolizador de Hollywood. Em outras palavras, as pessoas tendem a buscar no Cinema uma "anestesia", fugir da realidade; e nisso, os norte-americanos são mestres, mesmo que oscilando entre obras-primas e quase produtos. Quando algo exige do espectador que ele olhe as imagens, olhe de verdade, e não só seja olhado por elas, as coisas são diferentes.

Tudo isso se encaixa tão perfeitamente em um filão de filmes renegados aos multiplex, injustiçados ou não por isso. O que "Goodbye Solo", longa norte-americano que saiu vitorioso em Veneza e acumula notas altíssimas nos principais bancos de dados de críticos da internet, é exatamente uma constatação do que o Cinema pode fazer de melhor, sem ser um escape da realidade. O filme do diretor Ramin Bahrani, ao contrário de nos levar pra longe durante 1h30min, não; ele nos traz mais perto ainda da própria vida real. Nem todos querem isso, o que é compreensível e respeitável, mas também exclui uma das maiores contribuições que a sétima arte pode trazer para alguém.

"Goodbye Solo" é uma obra sobre a morte, e consequentemente, também sobre a vida. Mais que isso, é um filme de pessoas. Pessoas simples, como eu e você. O longa respira a vida real, mas o faz de forma poética e bonita. E assim, traz uma beleza a essa vida real que, aos meus olhos, soa mais bela que a que tantos outros filmes se esforçam em trazer, geralmente "enfeitando" as relações, as pessoas, e a própria vida.


Muitos de nós preferem a vida na TV (e na grande tela). Provavelmente o fazem por uma imposição da modernidade, e isso pode se dar quase sempre de modo inconsciente. Um filme como "Goodbye Solo", me faz preferir a vida real. Saí do Cinema me sentindo mais vivo, e quando penso que sentir-se vivo de verdade não é algo que acontece a toda hora, fico devendo uma pro Bahrani.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Aqui

Minha família praticamente fundou o condomínio onde moro. Não literalmente, mas praticamente desde que os primeiros tijolos começaram a ganhar forma. Isso faz uns 30 anos, e é claro, eu ainda não estava aqui (pelo menos eu acho; quem acredita em reencarnação pode argumentar).
Com exceção de cinco anos da minha vida, todo o tempo estive aqui. Muitas vezes, sinto que não tenho casa, talvez por viver fora, talvez por um certo desapego mesmo. Isso não significa que não ame Irajá; amo profundamente, não o trocaria por Copacabana ou Ipanema. Sinta eu qualquer coisa (e sentiria em qualquer lugar), é o meu lar. 
Quando você cresce com um lugar, passa a fazer parte dele, de um modo bem especial. Muitos aqui viram meu pai e seus irmãos crescerem. Agora estão vendo seus filhos, e isso me dá alguns "tios" não-oficiais. A grande verdade é que esse condomínio de 30 anos, que sintetiza um bairro inteiro (pra mim e arrisco dizer, pra muitos), representa uma espécie de família informal. É como uma cidade pequena.
Acho que quando nasci já gostaram de mim, só por carregar o sobrenome que carrego. E no momento em que disse que iria fazer Cinema, muita gente ficou feliz. Saber que um "artista" sairia daqui, devia ser um motivo de orgulho ou algo assim. Sempre achei isso muito, ainda acho e talvez vá sempre achar (entre nós aqui, às vezes choro de emoção, mas sempre convicto de que estão exagerando comigo).
Muitas vezes me encontravam nas ruas e perguntavam: "quando vou te ver na próxima novela das oito?". Eu tentava dizer que nunca viria a ser famoso, que meu destino não era a Globo, e que faria alguns filmes que ninguém provavelmente ia ver. Mas não adiantava muito. De qualquer modo, fazer Cinema tornou-se fazer algo não só por mim, mas por nós. Nada mais justo, já que como diria um dos meus grandes mestres, "se for pra fazer só pra você, escreva poesia ou faça um blog" (olha só!). "Cinema é pra todos", ele costuma dizer. 
Nesse meio tempo - de 2006, meu primeiro filme, até aqui - prometi pra muitas pessoas que elas ainda me veriam "dando certo". Eu não gosto de prometer nada, mas por um ato de carinho ou até de emoção, o fiz algumas vezes. Não sei se isso é presunção da minha parte, e espero que não, mas eu acho que elas até mereciam. Tudo isso não conta, é claro, que pra mim principalmente, meu futuro no Cinema é uma incógnita gigantesca. 
Uma das pessoas a quem havia prometido isso, se um dia chegar a acontecer mesmo, não poderá mais ver. Na verdade, esse é o grande motivo de todo esse texto kilométrico. Não sei muito bem como medir as palavras. Não sentia a morte há um bom tempo; pensava nela, como inevitável, mas não a sentia. E 24 horas depois do feriado das crianças, ela levou uma das pessoas que mais acreditava nesse meu sonho maluco. Uma das pessoas que mesmo sem ver um trabalho sequer meu, mais acreditava em mim. Alguém que eu esperava tanto poder um dia mostrar: "olha só, eu consegui!", mesmo sem saber se esse dia chegaria. 
Dizer seu nome seria mais uma lembrança da sua materialidade; prefiro lembrar dele, com aquilo que ele tinha de imaterial. E como muitos aqui, simplesmente não são capazes de abandonar suas raízes (não sei se sou um deles). Teve sua chance de ir embora, viver em outra cidade, com a família, mas não, preferiu, criticadamente, viver sozinho, mas aqui. Simplesmente porque aqui era sua casa. Aqui estão todos. Será que isso pode ser percebido? Isso pode ser medo, apego, ou qualquer coisa, mas que também é amor, é.
Ele gostava muito da minha família, muito mesmo. Gostava muito de mim também, eu sentia isso. Sentia uma consideração e um afeto maior do que recebo de alguns bons amigos, até. Eu também gostava muito dele. E agora me vem um sentimento estranho de dívida. 
Algum tempo antes de morrer, ele nos escreveu uma carta, que traduziu todo esse sentimento que carregava pela gente. Nela, além de citar cada membro da minha família (essa, a oficial), com muito carinho, me citava também como "nosso futuro grande astro" ou algo bem próximo disso. Nossa, nem tenho sequer pinta pra isso, só que essa frase carrega uma confiança tão grande, mas tão grande que me deixa sem ar, sem reação. E o que mais me comoveu foi o "nosso". "Nosso". Aqui.
Apesar de ter respondido e ter tentado demonstrar minha emoção pessoalmente, pensei em escrevê-lo uma carta, pra responder. E sempre que o via, pensava nisso. Agora não posso mais. Maldito amanhã, o grande mal do homem. Dívida dupla.
Acho que ele nunca vai saber o quanto suas palavras me motivaram e ainda me motivam. Que isso é algo que me impulsiona verdadeiramente. Que se um dia eu "der certo", uma das pessoas que irei me lembrar, será ele. Ele se foi. Agora eu entro aqui e sinto vazio; falta uma pilastra, uma casa. A idéia de nunca mais ver uma pessoa é assustadora. Eu não acredito em quase nenhum sistema religioso, e nem mesmo tenho qualquer certeza sobre um Deus, o que faz tudo ser mais intenso ainda.
Gostaria de ter escrito uma carta. Não escrevi. Escrevi isso. E agora preciso parar, pra não molhar o teclado.

domingo, 11 de outubro de 2009

Um pouco do Rio

Há uma semana atrás, postei alguma coisa sobre o fato da nossa cidade ter sido escolhida pra sediar as Olímpiadas. Isso já gerou bastante discussão (seja aqui, seja no metrô ou em qualquer outro canto), e é claro, as opiniões sempre divergem. O emaranhado de coisas boas que um evento/momento desse porte traz pra onde quer que aconteça, é completamente sedutor. Eu mesmo acho emocionante uma Olímpiada e uma Copa do Mundo (apesar da seleção brasileira encher menos meus olhos hoje, do que o próprio Flamengo).

Mas eu sei de uma coisa: daqui há 6 anos, nós já vamos ser outras pessoas. Só não sei se o Rio vai ser outra cidade (me refiro aos mais de 2/3 que concentram a baixada e a zona norte, principalmente).

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Até hoje me emociona a morte do Rodrigo. E o Tico é um cara muito legal mesmo.

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Voltando ao Cinema, a vida útil do nosso "Cidade Partida" parece já estar se extinguindo. Tomara que consigamos algumas ONG's e Cineclubes, mas já valeu enquanto foi. Aliás, falando em Cineclube, ele vai abrir o Cineclube que estamos levando ao Juscelino Kubitschek, em Jardim América (meu ex-colégio). Enquanto isso, começam os preparativos para "O Dia Seguinte", nosso próximo trabalho, e "Coleção de Sonhos" já tem quase data certa de filmagens.





sábado, 3 de outubro de 2009

Rio 2016



Não faço idéia de quantas pessoas estavam na praia para comemorar a escolha do Rio de Janeiro como sede das olimpíadas de 2016. Sei que foram muitas, e isso basta. Sei que também, um evento desse caráter vai trazer muitas alegrias e felicidades pro povo, possivelmente não excluindo a mim mesmo.

O que mais me intriga (pra não dizer, incomoda profundamente), é ver discaradamente a hipocresia e a falta de respeito do governo em um momento como esse. É tão claro, mais tão claro, que ninguém vê.

Bilhões vão ser mobilizados para viabilizar as Olimpíadas, mas pra saúde e educação (pra não extender a lista), não há dinheiro. Pra pedir por uma vida mais digna (pra não dizer o clichê, melhor), não há uma mobilização populacional como essa.

João Hélio morre, e participamos de uma passeata com 15 pessoas na orla de Copacabana. Mas pra Olimpíadas, todos estão lá, juntos e reunidos. É pra isso que sabemos nos reunir. E é por isso que mais "Joãos" vão morrer todos os dias.

Será que a nossa cegueira é tão grande assim? Vivemos em uma guerra civil não oficial, o povo rebaixado diariamente por uma política de pão e circo contemporânea, e ninguém vê que, o governo pode mudar isso, e não muda porque simplesmente não quer? Olha isso, pelo amor de Deus, dinheiro há, senão não seríamos sede de uma copa do mundo e de uma olimpíada!

Acho que preciso relativizar essa cegueira: a educação é privatizada.

E tudo bem também, vão dizer que o investimento todo sairá do Ministério do Esporte. Aham.

Festival do Rio - Sexta 02/10

Não sei há quantos anos eu quero fazer Cinema, mas é com certa timidez que eu admito ser a primeira vez que vou, de fato, ao Festival do Rio de Cinema (chega a ser irônico eu ter ido primeiro ao festival de outra cidade). Tudo bem que o Rio de Janeiro vive bastante o Cinema, mas isso não se aplica necessariamente a baixada fluminense e a zona norte (lê-se subúrbios), já que por aqui, as lonas culturais se resumem em exibir filmes já exibidos anteriormente ou coisas do tipo. Resumindo: você não vai encontrar o filme vencedor da Palma de Ouro, "A Fita Branca", no shopping de Madureira, nem ver certos longas nacionais que provavelmente não entrarão em circuito nas lonas culturais (aliás, se entrarem em circuito, é de quase certo que não virão pra cá mesmo, então não fica muito diferente).

Esse não era o ponto chave dessa postagem, que na verdade é mais otimista do que contestativa, no fundo. "A Fita Branca", do Michael Haneke, é um filme muito bem feito, de um diretor que respeita não só suas personagens, mas também os espectadores. Quando lembro de Haneke e do seu "Violência Gratuita", e agora assistindo a esse belo trabalho, só consigo pensar em alguém com um grande respeito pelo ser humano. A formalidade e ao mesmo tempo a naturalidade que esse seu último filme tem, só reforça isso. Esse é um cineasta com um grande senso de responsabilidade com seu próprio Cinema.



Porém o mais interessante da noite foi assistir ao último trabalho do diretor brasileiro Beto Brant, de "Os Invasores" e o elogioado "Cão sem Dono". É motivador ver um filme que parece saído de uma câmera Mini-Dv comum dando certo. "O Amor Segundo B. Schianberg" é quase um trabalho de videoarte cinematográfico, filmado, segundo Beto, por câmeras de vigilância. Ou seja, em quase todo o tempo, ouvimos os chiados naturais de uma gravação amadora (o que não é esse trabalho, de fato). O que isso representa pra nós?
A possibilidade do fazer.

Woody



Muitas vezes eu lia alguns depoimentos de Woody Allen, e por vezes o achava arrogante. "Quando penso em Kubrick, tenho que admitir que houve um cineasta melhor que eu" e coisas do tipo, me afastavam um pouco dos seus filmes, até porque, algumas de suas obras mais atuais são um pouco (pouco) diferentes da gama de maravilhas cinematográficas que ele produziu nos anos 70/80. Sem qualquer juízo de valor, é claro, mas "Match Point" e "Bananas" não parecem ter sido feitos pela mesmo cineasta, é só. Bem, isso superficialmente. Uma análise mais profunda evidencia a mão de um autor que tem o que dizer sobre e para a sociedade, por detrás desses filmes.

Pois bem, não precisei de muito para gostar (e bastante) de Woody Allen, depois de assistir à obra prima da década de 80 "A Rosa Púrpura do Cairo". Mas na última semana me dediquei a conhecer seu trabalho mais a fundo, e vi seus praticamente três primeiros filmes.

"Um Assaltante Bem Trapalhão" ("Take the Money and Run", 1969), seu primeiro como diretor e roteirista (antes já havia dirigido um filme, mas com outro diretor, o que dá a esse quase um caráter de "estréia"), é também o que achei mais engraçado até então. De fato, faz rir por besteiras, mas com uma classe que só Woody Allen tem. Não consigo imaginar outro exemplo de humor bobo e ao mesmo tempo fino, como nesse caso. Putz, é muito bom.

"Bananas" já é um humor mais politizado, sem perder a inteligência e a classe. O filme feito em 70 (mais precisamente, 1971), tem pelo menos uma cena que é completamente atual, ou que talvez, ganhe mais dimensão hoje do que já teve há 30 anos atrás ou em qualquer outro momento da história. No momento em questão, a lua de mel do casal principal é coberta pela imprensa. O que é isso, senão o fim da privacidade na era contemporânea e a febre dos reality shows?

"Tudo que você sempre quis saber sobre sexo", do ano seguinte, é no final das contas um deboche com o próprio sexo. Trata-se de uma série de histórias avulsas, como curta-metragens, que falam (ou mais ou menos isso), sobre o tema em questão. A última é genial. Coisa de Woody Allen. E hoje quando lembro das afirmações que ele fazia envolvendo Kubrick (e também Bergman, quando esse morreu), eu sorrio.