quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

E o terror de verdade



Há uma séria possibilidade dos filmes de terror (ou horror, talvez) precisarem pagar tributo à "Bruxa de Blair" nos próximos tempos. O longa (que até hoje não vi, às vezes por falta de coragem) trouxe uma estética documental que leva ao gênero do medo um patamar particularmente poderoso: a intensificação da verossimilhança do que ocorre na tela. Isso funciona perfeitamente bem em filmes de terror, se bem empregados, porque simplesmente dá um tom de realidade algumas vezes fascinante, e simplesmente, mais medo.

Depois de "Bruxa", "Cloverfield" e "REC", que vem nessa mesma linha (e muitos anos depois do longa de 99), são bastante eficazes, com suas qualidades e defeitos ("REC" particularmente eu acho bem legal). Algumas outras coisas têm sido feitas. Não sei como estão.

Tive medo então de "Atividade Paranormal". Não do filme em si, porque pensava isso já antes de vê-lo, mas de pensar que ele era um indício de um novo filão se aproximando. Estava meio enganado, porque o filme não é apenas bom, como também provavelmente será o responsável por esse filão. O sucesso grande do longa de estréia do esperto Oren Peli vai sem dúvidas abrir os olhos dos estúdios. Já tem um "Contatos de 4° Grau" chegando. E o próprio Oren já está vindo com um "Área 51" nesses moldes. Sem contar com o filme de um jovem cineasta que foi exibido em Cannes esse ano, "Colin".

Ou seja, o grande problema das tendências é a banalização, o que pode ser uma pena para essa estética tão eficaz. Quando a criatividade deixar de ser o ponto forte desses filmes, vai ser difícil filtrar a qualidade. Pode ser que estética e interesses comerciais soberanos se misturem, ofuscando-se. Engraçado que os longas citados reciclam elementos de outros trabalhos feitos antes (principalmente o "Atividade"), mas funcionam tão bem por terem uma certa carga de experimentação; de ousadia. Espero que isso não seja diluído com um novo filão que ameaça chegar. E que se chegar, ao menos traga bons exemplares.

Mas se não trouxer, pode ser que me desiluda e vá ver "Bruxa de Blair".

[*]

 E "Atividade Paranormal" deve ser o melhor filme de terror do ano.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Diário de Sintra




É muito difícil falar de obras que transcendem palavras, ou melhor dizendo, que as dispensa em seu discurso básico. Afinal, usar palavras quando a arte não o faz, é uma tarefa no mínimo arriscada. Mas mesmo assim, ao pensar no longa "Diário de Sintra", da cineasta e artista visual Paula Gaitán, vale dizer que ela fez um trabalho claramente delicado, com forte domínio técnico, além de explorar caminhos possíveis para o documentário e o para o próprio Cinema. Além disso, é um filme altamente emocional e pessoal, autêntico, que dialoga deliberadamente com as artes visuais, alcançando um resultado no mínimo, bem vindo.

AVATAR



Em 1998, ao ganhar o décimo primeiro Oscar por "Titanic", James Camoren parafraseou seu protagonista, vivido por Leonardo DiCaprio, ao dizer a frase "eu sou o rei do mundo!" ("I'm the king of the world!''). "Avatar" cumpre, então, a lógica do que se poderia esperar do próximo passo de um diretor que havia sido o principal responsável pelo maior sucesso de bilheteria de todos os tempos e o filme mais famoso de uma geração inteiramente, possivelmente.

É um filme espetáculo, com tudo aquilo que se espera de uma experiência cinematográfica desde Spielberg e "Tubarão", trazendo ainda um contexto ecológico (interessante) em um momento totalmente oportuno, além da melhor CGI já feita até então.

Hollywood de classe.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Diários de Motocicleta



Walter Salles é um dos maiores nomes do Cinema mundial contemporâneo. Isso não é exagero: o cineasta não só é um dos grandes responsáveis pela recolocação do Cinema Brasileiro no mapa, como também simplesmente é um dos realizadores mais admirados em todo o mundo. Há algo em seus filmes, uma espécie de tom humanista muito sincero, minimalista e ao mesmo tempo poético, que encanta artistas e admiradores da sétima arte.

"Diários de Motocicleta", um dos passos mais ambiciosos do diretor até então, não é só um de seus trabalhos mais maduros, mas também um dos grandes filmes feitos na América Latina em toda a década. Isso se dá não só por (bons) méritos cinematográficos: o longa baseado na viagem de Ernesto Guevara e Alberto Granado tem o poder de respirar um continente inteiro, e isso não é pouca coisa. É uma obra de pertencimento.

São muitos os méritos do trabalho de Walter Salles: o acerto preciso de se filmar em 16mm, para dar o clima intimista necessário ao filme; as atuações igualmente precisas dos talentosos Gael Garcia Bernal e Rodrigo de la Serna (primo de segundo grau do verdadeiro "Che"), ricas em nuances; a trilha do sempre impecável Gustavo Santaollala; a fotografia e o bom uso da estética mais próxima de um estilo documental. A equipe de "Diários de Motocicleta", que ainda conta com Robert Redford como um dos produtores, sabia da empreitada artística que estava incubida ao assumir a ambição de filmar a viagem que transformou o jovem Ernesto em um dos líderes políticos mais importantes do século passado. Essa consciência, mesclada com respeito e fidelidade ao espírito dessa viagem e de seus protagonistas (todos eles, não só os viajantes, mas também quem cruzou o caminho deles e vice-versa), pode ser encontrada no filme. E é exatamente isso também que faz com que "Diários" seja especial.  

Há momentos chave para entender e sentir toda essa afirmação cultural da América Latina - inclusive como continente integrado. A própria estética já traz a sugestão. E a mão de Walter, tão presente em todo o filme, merece ao menos um destaque particular: a comovente sequência do leprosário de San Pablo. Ela é a maior prova do talento humanista de se contar estórias e histórias através do Cinema que o cineasta tem. É um momento do longa muito vivo, orgânico, que é tocante sem ser pedante. "Diários de Motocicleta" está repleto desse toque de vida; é um filme orgânico, em outras palavras.

E em momentos como esse que se evidencia o porquê do Cinema de Walter Salles ser um Cinema de respeito em todo o mundo: porque sua obra é uma obra que respeita a arte em si, e mais importante, o próprio homem.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O Despertar da Primavera, Claudio Torres e Lua Nova



Tempos de muita correria, acabei deixando de postar qualquer coisa aqui faz muito tempo. Sempre pensei que um blog meu não teria uma vida útil muito longa, mas vou tentar contrariar mais um pouco essa minha impressão.

Nesse meio tempo, assisti duas coisas que me pareceram pertencer a quase um mesmo movimento artístico: a peça musical "O Despertar da Primavera", bom sucesso no circuito teatral do Rio e aposto dizer que do ano inteiro, e o filme de longa-metragem "Lua Nova", sequência da saga "Crepúsculo", baseada nos best sellers que vieram pra substituir a franquia de "Harry Potter" nos bolsos de Hollywood.

Essa opinião pode soar meio estranha, inclusive uma fã de ambos discordou de mim. "O Despertar" é de um texto escrito há mais de um século, enquanto o filão de "Crepúsculo" chegou a pouco tempo. Mas os dois guardam não só semelhanças estéticas, como também de linguagem. O elenco pode ser facilmente comparado com o de outra, ao menos fisicamente falando: eles parecem pertencer a mesma geração, a mesma tribo. As duas obras falam sobre e para os jovens. E ambas suavizam e amenizam consideravelmente em certos momentos de maior impacto por serem feitas para um público da faixa de 12/14 anos em diante.

"O Despertar da Primavera" me deixou muito intrigado. Não só com a peça, mas comigo mesmo. Eu via a reação da maior parte das pessoas ao meu redor, de fascínio, de quase adoração (muita gente vê a peça mais de uma vez, generosamente falando), enquanto que eu estava bem pensativo. Tecnicamente, a peça é impecável; digamos que a mise-en-scène de palco é excelente. O controle das ações dos atores, as diferentes coreografias que acontecem silmultâneamente, tudo, tudo é impressioante.

O elenco também merece destaque. Independente de juízos de valor, percebe-se claramente que quase todos ali - jovens basicamente, com exceção de dois atores - agarram a oportunidade de estar em uma produção de tal porte (o musical vem da Broadway) com unhas e dentes. Algumas atuações são de fato incríveis.

Tendo em vista tudo isso, então, fiquei pensando porque diabos não compartilhava com todos os outros aquela mesma reação. E aí que vem em questão o cineasta brasileiro Claudio Torres. Claudio é filho da nossa grande atriz Fernanda Montenegro, e irmão da Fernanda Torres. Tem a arte na mesa de jantar. Diretor de "Redentor", "A Mulher do Meu Amigo" e "A Mulher Invisível". Confesso que nunca vi nenhum desses filmes, mas ao assistir uma palestra dele no Espaço Telezoom, passei a admirá-lo mesmo sem conhecer seu trabalho.

Ele simplesmente tem uma visão de Cinema, de produção, de trabalho (e mercado de trabalho, por que não?) da sétima arte no Brasil e no mundo, que falta não só em alguns cineastas, mas também em muitos estudantes de Cinema. É claro que muito das questões que envolvem o chamado "Cinema Comercial" (rótulo totalmente discutível, e que discordo quase sempre), assim como também o "Cinema de Arte", merecem uma atenção e reflexão séria. E é claro que isso envolve, de certa forma, produção da Broadway e montagens de Brecht, por exemplo.

E então que cheguei a uma conclusão (não muito conclusiva, eu acho) sobre a crítica, nossa crítica mesmo, a respeito das obras de arte em geral. Até que ponto uma obra - seja ela teatro, cinema, - é ruim, tem problemas de fato, ou ela simplesmente não é a obra que gostaríamos de ver? Há uma linha bem tênue que separa esses dois extremos. Mas acho que essa consideração deve ser sempre levada ao fazer qualquer juízo de valor a respeito de uma obra de arte (e sempre vão dizer que às vezes não se tratam de obras de arte, mas sim de produtos comerciais, o que não deixa de ser verdade algumas vezes).

Então fiquei pensando que "O Despertar da Primavera" não me agradou tanto porque queria ver mais; que a abordagem tivesse ido mais além. A peça trata de temas bem pertinentes ainda hoje - revolucionários na época que foi escrita, na Alemanha do século XIX por Frank Wedekind, que curiosamente influenciou Brecht.Fala sobre ruptura, mas não traz rupturas de linguagem, do padrão já estabelecido da Broadway e até de Hollywood de contar estórias e de como contar. Ela quer falar sobre a dor daqueles personagens, mas não machuca. No final das contas, eu a achei divertida, mas não forte ou chocante como alguns taxaram. Realmente quem diz isso nunca viu "Anticristo" ou algum outro filme do Lars Von Trier, por exemplo. Não dá pra ver um filme desses toda semana.

É claro que no que diz respeito a sensações que tive na peça, são coisas provavelmente mais pessoais; para outros (muitos outros, pelo visto), foram sensações diferente. E faz parte da arte falar para cada um de maneira particular muitas vezes.

Ah, e quanto a "Lua Nova", deixo o José Mojica, nosso querido Zé do Caixão, falar: http://g1.globo.com/Noticias/Cinema/0,,MUL1402745-7086,00-ZE+DO+CAIXAO+DETONA+LUA+NOVA+DETESTO+VAMPIRO+MAQUIADO+E+FALTA+SEXO+NESSA+FI.html