quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

E o terror de verdade



Há uma séria possibilidade dos filmes de terror (ou horror, talvez) precisarem pagar tributo à "Bruxa de Blair" nos próximos tempos. O longa (que até hoje não vi, às vezes por falta de coragem) trouxe uma estética documental que leva ao gênero do medo um patamar particularmente poderoso: a intensificação da verossimilhança do que ocorre na tela. Isso funciona perfeitamente bem em filmes de terror, se bem empregados, porque simplesmente dá um tom de realidade algumas vezes fascinante, e simplesmente, mais medo.

Depois de "Bruxa", "Cloverfield" e "REC", que vem nessa mesma linha (e muitos anos depois do longa de 99), são bastante eficazes, com suas qualidades e defeitos ("REC" particularmente eu acho bem legal). Algumas outras coisas têm sido feitas. Não sei como estão.

Tive medo então de "Atividade Paranormal". Não do filme em si, porque pensava isso já antes de vê-lo, mas de pensar que ele era um indício de um novo filão se aproximando. Estava meio enganado, porque o filme não é apenas bom, como também provavelmente será o responsável por esse filão. O sucesso grande do longa de estréia do esperto Oren Peli vai sem dúvidas abrir os olhos dos estúdios. Já tem um "Contatos de 4° Grau" chegando. E o próprio Oren já está vindo com um "Área 51" nesses moldes. Sem contar com o filme de um jovem cineasta que foi exibido em Cannes esse ano, "Colin".

Ou seja, o grande problema das tendências é a banalização, o que pode ser uma pena para essa estética tão eficaz. Quando a criatividade deixar de ser o ponto forte desses filmes, vai ser difícil filtrar a qualidade. Pode ser que estética e interesses comerciais soberanos se misturem, ofuscando-se. Engraçado que os longas citados reciclam elementos de outros trabalhos feitos antes (principalmente o "Atividade"), mas funcionam tão bem por terem uma certa carga de experimentação; de ousadia. Espero que isso não seja diluído com um novo filão que ameaça chegar. E que se chegar, ao menos traga bons exemplares.

Mas se não trouxer, pode ser que me desiluda e vá ver "Bruxa de Blair".

[*]

 E "Atividade Paranormal" deve ser o melhor filme de terror do ano.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Diário de Sintra




É muito difícil falar de obras que transcendem palavras, ou melhor dizendo, que as dispensa em seu discurso básico. Afinal, usar palavras quando a arte não o faz, é uma tarefa no mínimo arriscada. Mas mesmo assim, ao pensar no longa "Diário de Sintra", da cineasta e artista visual Paula Gaitán, vale dizer que ela fez um trabalho claramente delicado, com forte domínio técnico, além de explorar caminhos possíveis para o documentário e o para o próprio Cinema. Além disso, é um filme altamente emocional e pessoal, autêntico, que dialoga deliberadamente com as artes visuais, alcançando um resultado no mínimo, bem vindo.

AVATAR



Em 1998, ao ganhar o décimo primeiro Oscar por "Titanic", James Camoren parafraseou seu protagonista, vivido por Leonardo DiCaprio, ao dizer a frase "eu sou o rei do mundo!" ("I'm the king of the world!''). "Avatar" cumpre, então, a lógica do que se poderia esperar do próximo passo de um diretor que havia sido o principal responsável pelo maior sucesso de bilheteria de todos os tempos e o filme mais famoso de uma geração inteiramente, possivelmente.

É um filme espetáculo, com tudo aquilo que se espera de uma experiência cinematográfica desde Spielberg e "Tubarão", trazendo ainda um contexto ecológico (interessante) em um momento totalmente oportuno, além da melhor CGI já feita até então.

Hollywood de classe.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Diários de Motocicleta



Walter Salles é um dos maiores nomes do Cinema mundial contemporâneo. Isso não é exagero: o cineasta não só é um dos grandes responsáveis pela recolocação do Cinema Brasileiro no mapa, como também simplesmente é um dos realizadores mais admirados em todo o mundo. Há algo em seus filmes, uma espécie de tom humanista muito sincero, minimalista e ao mesmo tempo poético, que encanta artistas e admiradores da sétima arte.

"Diários de Motocicleta", um dos passos mais ambiciosos do diretor até então, não é só um de seus trabalhos mais maduros, mas também um dos grandes filmes feitos na América Latina em toda a década. Isso se dá não só por (bons) méritos cinematográficos: o longa baseado na viagem de Ernesto Guevara e Alberto Granado tem o poder de respirar um continente inteiro, e isso não é pouca coisa. É uma obra de pertencimento.

São muitos os méritos do trabalho de Walter Salles: o acerto preciso de se filmar em 16mm, para dar o clima intimista necessário ao filme; as atuações igualmente precisas dos talentosos Gael Garcia Bernal e Rodrigo de la Serna (primo de segundo grau do verdadeiro "Che"), ricas em nuances; a trilha do sempre impecável Gustavo Santaollala; a fotografia e o bom uso da estética mais próxima de um estilo documental. A equipe de "Diários de Motocicleta", que ainda conta com Robert Redford como um dos produtores, sabia da empreitada artística que estava incubida ao assumir a ambição de filmar a viagem que transformou o jovem Ernesto em um dos líderes políticos mais importantes do século passado. Essa consciência, mesclada com respeito e fidelidade ao espírito dessa viagem e de seus protagonistas (todos eles, não só os viajantes, mas também quem cruzou o caminho deles e vice-versa), pode ser encontrada no filme. E é exatamente isso também que faz com que "Diários" seja especial.  

Há momentos chave para entender e sentir toda essa afirmação cultural da América Latina - inclusive como continente integrado. A própria estética já traz a sugestão. E a mão de Walter, tão presente em todo o filme, merece ao menos um destaque particular: a comovente sequência do leprosário de San Pablo. Ela é a maior prova do talento humanista de se contar estórias e histórias através do Cinema que o cineasta tem. É um momento do longa muito vivo, orgânico, que é tocante sem ser pedante. "Diários de Motocicleta" está repleto desse toque de vida; é um filme orgânico, em outras palavras.

E em momentos como esse que se evidencia o porquê do Cinema de Walter Salles ser um Cinema de respeito em todo o mundo: porque sua obra é uma obra que respeita a arte em si, e mais importante, o próprio homem.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O Despertar da Primavera, Claudio Torres e Lua Nova



Tempos de muita correria, acabei deixando de postar qualquer coisa aqui faz muito tempo. Sempre pensei que um blog meu não teria uma vida útil muito longa, mas vou tentar contrariar mais um pouco essa minha impressão.

Nesse meio tempo, assisti duas coisas que me pareceram pertencer a quase um mesmo movimento artístico: a peça musical "O Despertar da Primavera", bom sucesso no circuito teatral do Rio e aposto dizer que do ano inteiro, e o filme de longa-metragem "Lua Nova", sequência da saga "Crepúsculo", baseada nos best sellers que vieram pra substituir a franquia de "Harry Potter" nos bolsos de Hollywood.

Essa opinião pode soar meio estranha, inclusive uma fã de ambos discordou de mim. "O Despertar" é de um texto escrito há mais de um século, enquanto o filão de "Crepúsculo" chegou a pouco tempo. Mas os dois guardam não só semelhanças estéticas, como também de linguagem. O elenco pode ser facilmente comparado com o de outra, ao menos fisicamente falando: eles parecem pertencer a mesma geração, a mesma tribo. As duas obras falam sobre e para os jovens. E ambas suavizam e amenizam consideravelmente em certos momentos de maior impacto por serem feitas para um público da faixa de 12/14 anos em diante.

"O Despertar da Primavera" me deixou muito intrigado. Não só com a peça, mas comigo mesmo. Eu via a reação da maior parte das pessoas ao meu redor, de fascínio, de quase adoração (muita gente vê a peça mais de uma vez, generosamente falando), enquanto que eu estava bem pensativo. Tecnicamente, a peça é impecável; digamos que a mise-en-scène de palco é excelente. O controle das ações dos atores, as diferentes coreografias que acontecem silmultâneamente, tudo, tudo é impressioante.

O elenco também merece destaque. Independente de juízos de valor, percebe-se claramente que quase todos ali - jovens basicamente, com exceção de dois atores - agarram a oportunidade de estar em uma produção de tal porte (o musical vem da Broadway) com unhas e dentes. Algumas atuações são de fato incríveis.

Tendo em vista tudo isso, então, fiquei pensando porque diabos não compartilhava com todos os outros aquela mesma reação. E aí que vem em questão o cineasta brasileiro Claudio Torres. Claudio é filho da nossa grande atriz Fernanda Montenegro, e irmão da Fernanda Torres. Tem a arte na mesa de jantar. Diretor de "Redentor", "A Mulher do Meu Amigo" e "A Mulher Invisível". Confesso que nunca vi nenhum desses filmes, mas ao assistir uma palestra dele no Espaço Telezoom, passei a admirá-lo mesmo sem conhecer seu trabalho.

Ele simplesmente tem uma visão de Cinema, de produção, de trabalho (e mercado de trabalho, por que não?) da sétima arte no Brasil e no mundo, que falta não só em alguns cineastas, mas também em muitos estudantes de Cinema. É claro que muito das questões que envolvem o chamado "Cinema Comercial" (rótulo totalmente discutível, e que discordo quase sempre), assim como também o "Cinema de Arte", merecem uma atenção e reflexão séria. E é claro que isso envolve, de certa forma, produção da Broadway e montagens de Brecht, por exemplo.

E então que cheguei a uma conclusão (não muito conclusiva, eu acho) sobre a crítica, nossa crítica mesmo, a respeito das obras de arte em geral. Até que ponto uma obra - seja ela teatro, cinema, - é ruim, tem problemas de fato, ou ela simplesmente não é a obra que gostaríamos de ver? Há uma linha bem tênue que separa esses dois extremos. Mas acho que essa consideração deve ser sempre levada ao fazer qualquer juízo de valor a respeito de uma obra de arte (e sempre vão dizer que às vezes não se tratam de obras de arte, mas sim de produtos comerciais, o que não deixa de ser verdade algumas vezes).

Então fiquei pensando que "O Despertar da Primavera" não me agradou tanto porque queria ver mais; que a abordagem tivesse ido mais além. A peça trata de temas bem pertinentes ainda hoje - revolucionários na época que foi escrita, na Alemanha do século XIX por Frank Wedekind, que curiosamente influenciou Brecht.Fala sobre ruptura, mas não traz rupturas de linguagem, do padrão já estabelecido da Broadway e até de Hollywood de contar estórias e de como contar. Ela quer falar sobre a dor daqueles personagens, mas não machuca. No final das contas, eu a achei divertida, mas não forte ou chocante como alguns taxaram. Realmente quem diz isso nunca viu "Anticristo" ou algum outro filme do Lars Von Trier, por exemplo. Não dá pra ver um filme desses toda semana.

É claro que no que diz respeito a sensações que tive na peça, são coisas provavelmente mais pessoais; para outros (muitos outros, pelo visto), foram sensações diferente. E faz parte da arte falar para cada um de maneira particular muitas vezes.

Ah, e quanto a "Lua Nova", deixo o José Mojica, nosso querido Zé do Caixão, falar: http://g1.globo.com/Noticias/Cinema/0,,MUL1402745-7086,00-ZE+DO+CAIXAO+DETONA+LUA+NOVA+DETESTO+VAMPIRO+MAQUIADO+E+FALTA+SEXO+NESSA+FI.html

sábado, 14 de novembro de 2009

This is It



A dança tem o poder de fazer o homem superar seu próprio corpo. A música, de superar a própria alma. Michael Jackson era ambas. Ele era a dança e a música em matéria. Não era uma pessoa; homem ou mulher. Ele era a arte personificada. Mesmo dentro de um esquema altamente industrial (a avançada indústria cultural contemporânea), o talento que desde menino Jacko apresentava era inegavelmente especial. Não é por pouco que Michael detém o título de Rei do pop: ele o era de fato.

O filme de Kenny Ortega é correto, com uma montagem e abordagem estética bem escolhida pelo diretor. O documentário é um presente para os fãs, uma espécie de amostra do que seria a turnê "This is It". Poderia pender para sensacionalismo em alguns momentos; forçar algumas lágrimas em outros. Contudo, não o faz. E isso é bem vindo.

Ah, e convenhamos: "Thriller" (a música e o videoclipe) é a coisa mais Legal já produzida na cultura pop até hoje.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Hoje no Rio



Hoje o nosso presidente veio até a Mangueira inaugurar uma nova quadra de esporte e cultura, onde disse em entrevista que em sua opinião, os criminosos são pessoas "anormais". Pois é, senhor presidente, nossas políticas parecem não só privilegiar a elite, mas também paralelamente (ou não) a exclusão. E somando isso aos séculos de regime escravocrata que o Brasil carrega, interrompido mas que ainda desfila suas cicatrizes diariamente à todos os olhos atentos, essa "anormalidade" que criminosos [?] possuem é quase que patológica. Isso não é uma defesa, é só uma constatação.

[*]




"O adolescente Rafael Rocha Ribeiro, 15 anos, foi enterrado na tarde desta quinta-feira no Cemitério de Irajá, na Zona Norte do Rio. O jovem foi morto com um tiro de fuzil na cabeça na manhã de quarta-feira, durante confronto entre policiais militares e traficantes no Complexo de Manguinhos, na Zona Norte do Rio."

Texto e imagem: Jornal O Dia/Dia Online

[*]







sábado, 24 de outubro de 2009

Distrito 9



"Distrito 9" é uma boa surpresa nesse ano, e principalmente, é uma boa surpresa pra ficção científica feita nos últimos anos. As alegorias que ele abre, tecendo paralelos entre os alienígenas e os próprios humanos (não se resumindo apenas ao "Apertheid", como alguns disseram), são bem inteligentes. Só o fato de ter uma favela formada por "Et's", a maneira como os mesmos são tratados pela sociedade, e a estética documental mesclada à ficção, fazem de "Distrito" um filme que vale a pena ser assistido. E se não tiver uma continuação, aquele final vai possivelmente dar mais ainda um status meio "cult" ao longa.    

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

.



Andrea Beltrão realmente poderia sustentar um papel de protagonista numa novela das oito (ou das nove). É um exemplo de atriz que acredita e se entrega aos papéis que faz. Curioso que ela fez dois filmes com temáticas bem parecidas no último ano: "Verônica" e o mais recente "Salve Geral". O que me surpreende é o fato desse último ter sido o escolhido para representar o Brasil numa vaga pelo Oscar. Absolutamente nada contra tratar da violência no Cinema, muito pelo contrário, mas isso os cineastas brasileiros já fizeram outras vezes de forma excepcional, principalmente no campo do documentário, e não foram agraciados com tamanho valor.

Ainda acho que o melhor longa nacional de 2009 é o documentário "Corumbiara", até então injustiçado no circuito, o que tira a grande oportunidade das pessoas assistirem a esse belíssimo trabalho, que é tremendamente humano e brasileiro. É uma pena, pena mesmo, que a obra de Vincent e do Marcelo não chegue as salas de Cinema.  Devia ser uma obrigação do Minc que esse filme fosse exibido. Quem sabe, ainda tem estrada pela frente, eles podem conseguir.

E algo me diz que "Viajo porque preciso, volto porque te amo", que infelizmente não vi, seria o mais indicado àquela tal vaga.

[*]




"UP" realmente é impressionante. Muito, muito bom. Um dos melhores filmes de 2009, eu aposto. E tem gente que ainda acha que animação é coisa só de criança.

Bem, as da Pixar não são.

[*]





Por fim, "Bastardos Inglórios" é mais um presente do Tarantino ao Cinema. O único compromisso dos filmes do diretor, é com a própria sétima arte. Ou seja, é Cinema pelo Cinema; um Cinema que homenageia a sua própria arte. "Bastardos Inglórios" é praticamente um desfile de homenagens [cenas] à arte fílmica. Cada momente ali parece ser uma declaração de amor ao poder dos filmes e a arte de fazê-los. Ou seja, assistí-lo é o equivalente a comer um pavê de chocolate suíço: é delicioso. Mas ainda melhor.


quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Goodbye Solo




Um dos principais motivos que afasta o grande público dos filmes europeus, latinos, e até brasileiros, se concentra no fato da maior parte do Cinema feito nessas regiões ter um ritmo diferente do padrão monopolizador de Hollywood. Em outras palavras, as pessoas tendem a buscar no Cinema uma "anestesia", fugir da realidade; e nisso, os norte-americanos são mestres, mesmo que oscilando entre obras-primas e quase produtos. Quando algo exige do espectador que ele olhe as imagens, olhe de verdade, e não só seja olhado por elas, as coisas são diferentes.

Tudo isso se encaixa tão perfeitamente em um filão de filmes renegados aos multiplex, injustiçados ou não por isso. O que "Goodbye Solo", longa norte-americano que saiu vitorioso em Veneza e acumula notas altíssimas nos principais bancos de dados de críticos da internet, é exatamente uma constatação do que o Cinema pode fazer de melhor, sem ser um escape da realidade. O filme do diretor Ramin Bahrani, ao contrário de nos levar pra longe durante 1h30min, não; ele nos traz mais perto ainda da própria vida real. Nem todos querem isso, o que é compreensível e respeitável, mas também exclui uma das maiores contribuições que a sétima arte pode trazer para alguém.

"Goodbye Solo" é uma obra sobre a morte, e consequentemente, também sobre a vida. Mais que isso, é um filme de pessoas. Pessoas simples, como eu e você. O longa respira a vida real, mas o faz de forma poética e bonita. E assim, traz uma beleza a essa vida real que, aos meus olhos, soa mais bela que a que tantos outros filmes se esforçam em trazer, geralmente "enfeitando" as relações, as pessoas, e a própria vida.


Muitos de nós preferem a vida na TV (e na grande tela). Provavelmente o fazem por uma imposição da modernidade, e isso pode se dar quase sempre de modo inconsciente. Um filme como "Goodbye Solo", me faz preferir a vida real. Saí do Cinema me sentindo mais vivo, e quando penso que sentir-se vivo de verdade não é algo que acontece a toda hora, fico devendo uma pro Bahrani.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Aqui

Minha família praticamente fundou o condomínio onde moro. Não literalmente, mas praticamente desde que os primeiros tijolos começaram a ganhar forma. Isso faz uns 30 anos, e é claro, eu ainda não estava aqui (pelo menos eu acho; quem acredita em reencarnação pode argumentar).
Com exceção de cinco anos da minha vida, todo o tempo estive aqui. Muitas vezes, sinto que não tenho casa, talvez por viver fora, talvez por um certo desapego mesmo. Isso não significa que não ame Irajá; amo profundamente, não o trocaria por Copacabana ou Ipanema. Sinta eu qualquer coisa (e sentiria em qualquer lugar), é o meu lar. 
Quando você cresce com um lugar, passa a fazer parte dele, de um modo bem especial. Muitos aqui viram meu pai e seus irmãos crescerem. Agora estão vendo seus filhos, e isso me dá alguns "tios" não-oficiais. A grande verdade é que esse condomínio de 30 anos, que sintetiza um bairro inteiro (pra mim e arrisco dizer, pra muitos), representa uma espécie de família informal. É como uma cidade pequena.
Acho que quando nasci já gostaram de mim, só por carregar o sobrenome que carrego. E no momento em que disse que iria fazer Cinema, muita gente ficou feliz. Saber que um "artista" sairia daqui, devia ser um motivo de orgulho ou algo assim. Sempre achei isso muito, ainda acho e talvez vá sempre achar (entre nós aqui, às vezes choro de emoção, mas sempre convicto de que estão exagerando comigo).
Muitas vezes me encontravam nas ruas e perguntavam: "quando vou te ver na próxima novela das oito?". Eu tentava dizer que nunca viria a ser famoso, que meu destino não era a Globo, e que faria alguns filmes que ninguém provavelmente ia ver. Mas não adiantava muito. De qualquer modo, fazer Cinema tornou-se fazer algo não só por mim, mas por nós. Nada mais justo, já que como diria um dos meus grandes mestres, "se for pra fazer só pra você, escreva poesia ou faça um blog" (olha só!). "Cinema é pra todos", ele costuma dizer. 
Nesse meio tempo - de 2006, meu primeiro filme, até aqui - prometi pra muitas pessoas que elas ainda me veriam "dando certo". Eu não gosto de prometer nada, mas por um ato de carinho ou até de emoção, o fiz algumas vezes. Não sei se isso é presunção da minha parte, e espero que não, mas eu acho que elas até mereciam. Tudo isso não conta, é claro, que pra mim principalmente, meu futuro no Cinema é uma incógnita gigantesca. 
Uma das pessoas a quem havia prometido isso, se um dia chegar a acontecer mesmo, não poderá mais ver. Na verdade, esse é o grande motivo de todo esse texto kilométrico. Não sei muito bem como medir as palavras. Não sentia a morte há um bom tempo; pensava nela, como inevitável, mas não a sentia. E 24 horas depois do feriado das crianças, ela levou uma das pessoas que mais acreditava nesse meu sonho maluco. Uma das pessoas que mesmo sem ver um trabalho sequer meu, mais acreditava em mim. Alguém que eu esperava tanto poder um dia mostrar: "olha só, eu consegui!", mesmo sem saber se esse dia chegaria. 
Dizer seu nome seria mais uma lembrança da sua materialidade; prefiro lembrar dele, com aquilo que ele tinha de imaterial. E como muitos aqui, simplesmente não são capazes de abandonar suas raízes (não sei se sou um deles). Teve sua chance de ir embora, viver em outra cidade, com a família, mas não, preferiu, criticadamente, viver sozinho, mas aqui. Simplesmente porque aqui era sua casa. Aqui estão todos. Será que isso pode ser percebido? Isso pode ser medo, apego, ou qualquer coisa, mas que também é amor, é.
Ele gostava muito da minha família, muito mesmo. Gostava muito de mim também, eu sentia isso. Sentia uma consideração e um afeto maior do que recebo de alguns bons amigos, até. Eu também gostava muito dele. E agora me vem um sentimento estranho de dívida. 
Algum tempo antes de morrer, ele nos escreveu uma carta, que traduziu todo esse sentimento que carregava pela gente. Nela, além de citar cada membro da minha família (essa, a oficial), com muito carinho, me citava também como "nosso futuro grande astro" ou algo bem próximo disso. Nossa, nem tenho sequer pinta pra isso, só que essa frase carrega uma confiança tão grande, mas tão grande que me deixa sem ar, sem reação. E o que mais me comoveu foi o "nosso". "Nosso". Aqui.
Apesar de ter respondido e ter tentado demonstrar minha emoção pessoalmente, pensei em escrevê-lo uma carta, pra responder. E sempre que o via, pensava nisso. Agora não posso mais. Maldito amanhã, o grande mal do homem. Dívida dupla.
Acho que ele nunca vai saber o quanto suas palavras me motivaram e ainda me motivam. Que isso é algo que me impulsiona verdadeiramente. Que se um dia eu "der certo", uma das pessoas que irei me lembrar, será ele. Ele se foi. Agora eu entro aqui e sinto vazio; falta uma pilastra, uma casa. A idéia de nunca mais ver uma pessoa é assustadora. Eu não acredito em quase nenhum sistema religioso, e nem mesmo tenho qualquer certeza sobre um Deus, o que faz tudo ser mais intenso ainda.
Gostaria de ter escrito uma carta. Não escrevi. Escrevi isso. E agora preciso parar, pra não molhar o teclado.

domingo, 11 de outubro de 2009

Um pouco do Rio

Há uma semana atrás, postei alguma coisa sobre o fato da nossa cidade ter sido escolhida pra sediar as Olímpiadas. Isso já gerou bastante discussão (seja aqui, seja no metrô ou em qualquer outro canto), e é claro, as opiniões sempre divergem. O emaranhado de coisas boas que um evento/momento desse porte traz pra onde quer que aconteça, é completamente sedutor. Eu mesmo acho emocionante uma Olímpiada e uma Copa do Mundo (apesar da seleção brasileira encher menos meus olhos hoje, do que o próprio Flamengo).

Mas eu sei de uma coisa: daqui há 6 anos, nós já vamos ser outras pessoas. Só não sei se o Rio vai ser outra cidade (me refiro aos mais de 2/3 que concentram a baixada e a zona norte, principalmente).

[*]



Até hoje me emociona a morte do Rodrigo. E o Tico é um cara muito legal mesmo.

[*]

Voltando ao Cinema, a vida útil do nosso "Cidade Partida" parece já estar se extinguindo. Tomara que consigamos algumas ONG's e Cineclubes, mas já valeu enquanto foi. Aliás, falando em Cineclube, ele vai abrir o Cineclube que estamos levando ao Juscelino Kubitschek, em Jardim América (meu ex-colégio). Enquanto isso, começam os preparativos para "O Dia Seguinte", nosso próximo trabalho, e "Coleção de Sonhos" já tem quase data certa de filmagens.





sábado, 3 de outubro de 2009

Rio 2016



Não faço idéia de quantas pessoas estavam na praia para comemorar a escolha do Rio de Janeiro como sede das olimpíadas de 2016. Sei que foram muitas, e isso basta. Sei que também, um evento desse caráter vai trazer muitas alegrias e felicidades pro povo, possivelmente não excluindo a mim mesmo.

O que mais me intriga (pra não dizer, incomoda profundamente), é ver discaradamente a hipocresia e a falta de respeito do governo em um momento como esse. É tão claro, mais tão claro, que ninguém vê.

Bilhões vão ser mobilizados para viabilizar as Olimpíadas, mas pra saúde e educação (pra não extender a lista), não há dinheiro. Pra pedir por uma vida mais digna (pra não dizer o clichê, melhor), não há uma mobilização populacional como essa.

João Hélio morre, e participamos de uma passeata com 15 pessoas na orla de Copacabana. Mas pra Olimpíadas, todos estão lá, juntos e reunidos. É pra isso que sabemos nos reunir. E é por isso que mais "Joãos" vão morrer todos os dias.

Será que a nossa cegueira é tão grande assim? Vivemos em uma guerra civil não oficial, o povo rebaixado diariamente por uma política de pão e circo contemporânea, e ninguém vê que, o governo pode mudar isso, e não muda porque simplesmente não quer? Olha isso, pelo amor de Deus, dinheiro há, senão não seríamos sede de uma copa do mundo e de uma olimpíada!

Acho que preciso relativizar essa cegueira: a educação é privatizada.

E tudo bem também, vão dizer que o investimento todo sairá do Ministério do Esporte. Aham.

Festival do Rio - Sexta 02/10

Não sei há quantos anos eu quero fazer Cinema, mas é com certa timidez que eu admito ser a primeira vez que vou, de fato, ao Festival do Rio de Cinema (chega a ser irônico eu ter ido primeiro ao festival de outra cidade). Tudo bem que o Rio de Janeiro vive bastante o Cinema, mas isso não se aplica necessariamente a baixada fluminense e a zona norte (lê-se subúrbios), já que por aqui, as lonas culturais se resumem em exibir filmes já exibidos anteriormente ou coisas do tipo. Resumindo: você não vai encontrar o filme vencedor da Palma de Ouro, "A Fita Branca", no shopping de Madureira, nem ver certos longas nacionais que provavelmente não entrarão em circuito nas lonas culturais (aliás, se entrarem em circuito, é de quase certo que não virão pra cá mesmo, então não fica muito diferente).

Esse não era o ponto chave dessa postagem, que na verdade é mais otimista do que contestativa, no fundo. "A Fita Branca", do Michael Haneke, é um filme muito bem feito, de um diretor que respeita não só suas personagens, mas também os espectadores. Quando lembro de Haneke e do seu "Violência Gratuita", e agora assistindo a esse belo trabalho, só consigo pensar em alguém com um grande respeito pelo ser humano. A formalidade e ao mesmo tempo a naturalidade que esse seu último filme tem, só reforça isso. Esse é um cineasta com um grande senso de responsabilidade com seu próprio Cinema.



Porém o mais interessante da noite foi assistir ao último trabalho do diretor brasileiro Beto Brant, de "Os Invasores" e o elogioado "Cão sem Dono". É motivador ver um filme que parece saído de uma câmera Mini-Dv comum dando certo. "O Amor Segundo B. Schianberg" é quase um trabalho de videoarte cinematográfico, filmado, segundo Beto, por câmeras de vigilância. Ou seja, em quase todo o tempo, ouvimos os chiados naturais de uma gravação amadora (o que não é esse trabalho, de fato). O que isso representa pra nós?
A possibilidade do fazer.

Woody



Muitas vezes eu lia alguns depoimentos de Woody Allen, e por vezes o achava arrogante. "Quando penso em Kubrick, tenho que admitir que houve um cineasta melhor que eu" e coisas do tipo, me afastavam um pouco dos seus filmes, até porque, algumas de suas obras mais atuais são um pouco (pouco) diferentes da gama de maravilhas cinematográficas que ele produziu nos anos 70/80. Sem qualquer juízo de valor, é claro, mas "Match Point" e "Bananas" não parecem ter sido feitos pela mesmo cineasta, é só. Bem, isso superficialmente. Uma análise mais profunda evidencia a mão de um autor que tem o que dizer sobre e para a sociedade, por detrás desses filmes.

Pois bem, não precisei de muito para gostar (e bastante) de Woody Allen, depois de assistir à obra prima da década de 80 "A Rosa Púrpura do Cairo". Mas na última semana me dediquei a conhecer seu trabalho mais a fundo, e vi seus praticamente três primeiros filmes.

"Um Assaltante Bem Trapalhão" ("Take the Money and Run", 1969), seu primeiro como diretor e roteirista (antes já havia dirigido um filme, mas com outro diretor, o que dá a esse quase um caráter de "estréia"), é também o que achei mais engraçado até então. De fato, faz rir por besteiras, mas com uma classe que só Woody Allen tem. Não consigo imaginar outro exemplo de humor bobo e ao mesmo tempo fino, como nesse caso. Putz, é muito bom.

"Bananas" já é um humor mais politizado, sem perder a inteligência e a classe. O filme feito em 70 (mais precisamente, 1971), tem pelo menos uma cena que é completamente atual, ou que talvez, ganhe mais dimensão hoje do que já teve há 30 anos atrás ou em qualquer outro momento da história. No momento em questão, a lua de mel do casal principal é coberta pela imprensa. O que é isso, senão o fim da privacidade na era contemporânea e a febre dos reality shows?

"Tudo que você sempre quis saber sobre sexo", do ano seguinte, é no final das contas um deboche com o próprio sexo. Trata-se de uma série de histórias avulsas, como curta-metragens, que falam (ou mais ou menos isso), sobre o tema em questão. A última é genial. Coisa de Woody Allen. E hoje quando lembro das afirmações que ele fazia envolvendo Kubrick (e também Bergman, quando esse morreu), eu sorrio.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

As grades do condomínio são pra trazer proteção

Hoje fiquei na Zona Sul mais tarde. Acabei chegando em casa mais ou menos 21h30 da noite. Eu já esperava que fosse acontecer algum dia, mas quando de fato acontece, a ficha demora a cair. O portão da favela, que foi colocado na semana passada, estava trancado. Fiquei do lado de fora. Tive que dar a volta para chegar em casa.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O Homem Elefante



Se pudesse indicar um filme para alguém assistir antes de morrer, seria esse.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Marley, eu e o Cinema norte-americano

Assisti ao filme "Marley e Eu" no último domingo. Já devia ter ido preparado, sou meio sensível pra questões que concernem aos animais. Antes de assistí-lo, já tinha escutado algumas pessoas dizerem que choraram rios e que é um filme triste, etc., etc. As expectativas foram meio duais: por um lado, se tratava de uma adaptação de um dos grandes best sellers dos últimos anos; de outro, uma boa crítica do Pablo Villaça, geralmente exigente, além dos já citados "choros de final de filme".

É claro que alguns pseudo-intelectuais já devem ter descartado o livro só pelo fato de ser um mega sucesso, e consequentemente, o filme. Eu mesmo confesso nunca ter me interessado pela obra escrita, mas esses tipos de pré-julgamento às vezes usufruir certas emoções.

O filme é tipicamente norte-americano: uma comédia leve, com alguns momentos bem enfeitados e até mesmo, forçados. Mas deve-se admitir que a escolha de mostrar Marley como um cão e simplesmente isso, foi bem acertada. Não tenta-se mostrar um cachorro que é mais que isso; ele é um cachorro que vive na casa de seus donos. Poderia ser o nosso.

Eu preciso admitir que não consegui escapar, e também acabei o filme chorando. E se não tivesse me segurado, seria chorando muito. Se antes do terceiro ato, era um filme até meio bobinho, divertido, e ainda víamos Owen Wilson como o ator de comédias que é, a reta final toma um rumo competente. O próprio ator está bem no final; é seu grande momento. Mas a questão é uma: a história se sobressai sobre a linguagem, sendo isso uma virtude ou não. Os momentos finais da vida de um cachorro, pra quem já teve um, tem, ou gosta deles, é realmente duro. Duro demais.

Talvez o filme não trabalhe diretamente tudo que um cão representa. Ele simplesmente acompanha a vida do casal (com altos e baixos durante esse tempo, cinematograficamente falando), e o cão está lá, durante todos os anos. Os filhos nascem, crescem; o casal briga, se reconcilia; os empregos vão... Marley está lá. De certa forma, é até uma abordagem passiva.

Gostaria de falar mais sobre o filme; analisar mais profundamente seus aspectos, tanto técnicos quanto intelectuais. Não consigo, pelo menos agora. Sei que quando desliguei a televisão, minha vontade era abraçar meu cachorro. Me dói pensar quando vai chegar a sua hora, inevitavelmente. É como se nós merecessemos isso; eles, eles não.

Acabei dormindo ao seu lado.

Escola de bons filmes

Uma coisa é quase unânime na comunidade cinematográfica: a Pixar domina a gramática do bom Cinema. Desde o primeiro "Toy Story" e dos primeiros curtas-metragem, seus filmes são carregados de uma aura cheia de vida e intensidade, que elevou as animações para um patamar de qualidade quase próprio do estúdio. Poucos são os que encontram, dentro da cinematografia de sua filmografia, uma só nota destoante. Em outras palavras, a Pixar é para a animação, quase o que a Globo é para a TV (sem entrar em juízos de valores e moral).

"Wall-E" ("Wall-E", 2008), penúltima animação da empresa, é a prova viva do estágio alcançado pelo estúdio. O longa poderia ser facilmente considerado o "2001: Uma Odisséia no Espaço" das animações. Há coisas alí que definitivamente, só adultos (e não todos) serão capaz de perceber. A história de amor entre um robôzinho que vive sozinho em uma Terra inabitável no futuro, recolhendo lixo, e uma sonda robô, é também uma reflexão sobre os próprios seres humanos.

Aliás, características humanas a outros seres sempre foi um dos grandes desafios de todo animador. No filme dirigido por Andrew Stanton, não são só os olhos que criam uma identiicação entre uma máquina e o homem; são as próprias atitudes. O Wall E (como o robô é chamado) tem atitudes essencialmente nobres; nobreza essa até um tanto rara entre os próprios homens. Sua fragilidade e ao mesmo tempo, generosidade, é um ótimo contraponto ao que foi perdido pela humanidade, não só do filme, que se passa daqui a alguns séculos, mas também da vida real; do hoje.

Um detalhe que não pode passar despercebido é o cuidado meticuloso que a produção da obra tomou, ao cercar o filme não só com referências cinematográficas e filosóficas, mas também técnicas. A fotografia é deslumbrante, e o trabalho de som, impecável. O mestre Ben Burtt, nada mais nada menos que o designer de som de "Star Wars", assina também o design sonoro do filme, além de também supervisão de edição de som, designer das vozes das personagens e mixagem (junto com alguns outros, entre eles, Michael Semanick, responsável pela mixagem do brasileiro "O Homem do Ano"). Ainda por cima, a voz do Wall-E é de Burtt.

Indicado à 6 estatuetas do OSCAR, vencendo a de melhor animação, "Wall-E" colecionou prêmios. Segundo o IMDB, foram 44 ao todo, mais 37 indicações - coisa de obra prima. Não saberia dizer ao certo, se o filme da Pixar, de fato, é uma. Para mim, seu grande papel já foi feito: ele é uma previsão do futuro. E é claro, uma conquista cinematográfica de primeiríssima linha.


 

sábado, 12 de setembro de 2009

Carlos Saldanha

Assisti uma palestra do Carlos Saldanha, que me reforçou alguns pontos de vista. Pra quem não sabe, o Carlos é o diretor dos dois últimos "A Era do Gelo", além de co-dirigir o primeiro. O que isso significa? Que um brasileiro é um dos responsáveis por um dos grandes sucessos de bilheteria de anos específicos.
Saldanha tem integrado um time composto por Fernando Meirelles, Walter Salles e mais recentemente, Vicente Amorim, a filmar no exterior. Não só quaisquer filmes, mas grandes projetos. "A Era do Gelo" é um tradicional blockbuster de animação, e ter essa obra conduzida por um brasileiro é significativo.
Confessor não ter assistido aos filmes, mas ao ver a palestra, me interessei. O próprio admite o caráter comercial se sobrepondo ao artístico, no que concerne a animação. Não sei até onde isso corresponde ao que é, ou ao que não é. É complexo. Mas isso me faz pensar que há também resistência das pessoas em aceitar a animação como arte cinematográfica legítima.
Por favor, assistam a esse filme então: http://vimeo.com/3352352

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Alguns filmes

Mais um tempo sem computador; mais um tempo de conteúdo (?) atrasado. Pelo menos pude assistir à alguns filmes nos últimos dias que valem à pena.

Confesso que não assisti muitos filmes do Van Damme. Pelo menos não muitos que me marcaram, apesar de inevitalvemente me lembrar de "O Grande Dragão Branco" com certa simpatia nostálgica. Curioso que ao chegar às mãos um filme como "JCVD" (França, 2008), grande parte dos fãs do super astro irão recusá-lo. Eu arriscaria dizer que o filme que leva o nome de Jean Claude Van Damme no título (JCVD) é também seu filme mais diferente; peculiar. Talvez seja uma boa oportunidade para aqueles que não acompanham sua filmografia, e, infelizmente, um filme que vá desagradar aqueles que o fazem, já que não há uma ação frenética do começo ao fim, assim como uma série de elementos de sua carreira não se fazem presentes (até se fazem, mais em termos metalinguísticos).
Mesmo que resumir um filme seja injusto muitas vezes, vou arriscar: "JCVD" é um bom filme, que discute a própria figura do homem por trás do símbolo, e de como essa figura tornou-se também uma prisão angustiante. Pode-se questionar as habilidades de Jean Claude como ator, mas não pode-se questionar sua honestidade ao ver esse filme.
Detalhe para um monólogo ousado de Van Damme, quando ele fala direto com o espectador, que comprova, de certa forma, as linhas acima.
[*]

Walter Salles e Daniela Thomas fazem realmente uma bela dupla de cineastas. "Terra Estrangeira", um dos primeiros de suas carreiras, é um belo trabalho de Cinema, com características que principalmente Walter soube desenvolver ao longo de sua carreira.
O filme é quase que estrangeiro de si mesmo. Da competência habitual desenvolvida nesses últimos anos, a obra radiografa bem, nos seus planos muitas vezes estéticamente bonitos, a vida daqueles que são estrangeiros em sua própria terra, e perdem-se em terras estrangeiras, em busca desse encontro pessoal. A escolha do preto e branco só torna mais coerente o sentimento que perpassa o longa. 
[*]
 
Um dos filmes mais comentados do último ano, "REC" realmente é muito bem feito. Filma a tensão com categoria exemplar; a direção de câmera é excelente. 
Sua ambição é dual: ele poderia, em alguns momentos, traçar um olhar sobre o ser humano como seu maior inimigo, já que se trata de um grupo de pessoas presos em um prédio em quarentena (daí o enlatado norte-americano que saiu depois, refilmagem). Ele não o faz. Mas talvez, de forma sutil, isso esteja lá em certas cenas.
 [*]
"Once" ou "Apenas uma Vez", como ficou entitulado no Brasil, é simplesmente maravilhoso. Eu arriscaria dizer que o filme irlandês é uma obra prima do Cinema contemporâneo, principalmente ao ler esse contemporâneo considerando termos estéticos cinematográficos produzidos nos últimos anos (o uso do digital, por exemplo; câmera na mão).
É difícil tratar com palavras de um filme que respira música (é um musical, mas bem diferente do que se espera de um). Na verdade, "Apenas uma Vez" é simplesmente um tratado maduro sobre o amor, honesto e verdadeiro.
Belo filme, belo filme.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Humor fino

Sem computador por alguns dias, o que não deixa de ser uma coisa boa, também.

[*]
Assistí ao filme "A Era do Rádio", do Woody Allen. É um filho prodígio dele, e prova de todo seu talento como um dos grandes cineastas das últimas décadas a gravar nos EUA e até fora dele, ultimamente. É um humor fino, com classe, inegavelmente cinematográfico. Além de tudo, é uma declaração de amor ao Rádio.  

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Espelhos

Tóquio é mesmo um espelho da humanidade nos tempos modernos (ou hipermodernos).
Por outro lado, a África também. 

domingo, 23 de agosto de 2009

E os filmes estrangeiros

Saí muito contente e orgulhoso da mostra estrangeira. É incrível como a América Latina tem produzido coisas de qualidade no Cinema, de qualidade mesmo. Um Cinema vigoroso, honesto e humano.
[*]
"La Próxima Estación" não deve pegar tanto público de fora da Argentina, por questões geográficas, talvez. O documentário que trata das questões do transporte público dos hermanos, mais precisamente, dos trens, é bem feito, tem um diretor com forte desejo de produzir sua obra (por mais que possa soar panfletário em alguns momentos, o que não é necessariamente, ruim) e conseguiu belos depoimentos. A única dificuldade que tive foi de me localizar mesmo. Não fica muito claro se os problemas decorrentes da privatização do serviço afetaram todo o país, ou só uma região, o que às vezes prejudica o envolvimento com o filme. Talvez um excesso histórico no segundo capítulo, também...
[*]
"La Teta Asustada" ganhou Berlim, Guadalaraja e era muito aguardado. Levou o Kikito de melhor filme estrangeiro, além de outros prêmios, como para atriz. Técnicamente impecável, o longa é de uma beleza plástica muito competente. A direção cuidadosa de Claudio Llosa é certa; cada plano parece ter tido atenção especial. Contudo, a personagem principal é tão difícil, tão dura, tão fechada, que fica dificil o envolvimento. 
[*]
"Nochebuena" passou na mesma noite que Corumbiara. Pra mim, em termos gerais, a melhor noite do festival. O longa colombiano conduz a narrativa com uma agilidade que não destoa, tecendo um ritmo que vai crescendo como um vulcão em erupção, até chegar no clímax, um tanto lacônico, pra que tenha uma coda, no mínimo, inusitada. É humor negro puro, daqueles que não te deixa caindo em gargalhada, mas com um sorriso no canto da boca, e pensando: "que merda de homem nós somos".
PS:  A equipe do filme é maravilhosamente calorosa. Kikito de simpatia para eles.
[*]
"Lluvia" tem os melhores 15 minutos iniciais do festival. Talvez até mais. O início do filme é belíssimo e muito bem filmado. A história de amor (?), talvez a história de um "encontro" entre duas pessoas em Buenos Aires, é madura, honesta e tocante. Talvez em um momento, Paula Hernandez, a diretora, tenha focado muito os dramas íntimos e em silêncio, das suas personagens, sem antes apresentá-las pro público, o que pode refletir em certa lentidão da narrativa. Mas, no fim das contas, é um belo exemplo de Cinema argentino, latino, e até mesmo mundial.
[*]
Uma história sobre um homem de uns 1,90m de altura, segurança de dois lugares diferentes, com postura sisuda, que se apaixona por uma profissional de limpeza, e ainda por cima, é entitulado "Gigante", poderia render qualquer impressão. Ao acender as telas da sala de Cinema, um dos membros do júri falou: "achei o filme, meigo". E essa é a verdade.
Quase que um filme mudo, a história de obsessão desse homem é tão bela, simples, que é impossível não se envolver. Por trás de toda aquela massa, há uma pessoa completamente boa, sensível, e o longa narra isso com extrema sinceridade e respeito. É exemplo de Cinema humano, de uma obra de arte mesmo. Reitero novamente a questão da ausência de diálogos do filme, que é driblada perfeitamente. Não foi o que votei, mas na minha opinião, a melhor obra de ficção de todo o festival de Gramado.
PS Final: Percebi que não falo quase que nada sobre a história dos filmes, o que deve ser um saco pra quem não assistiu nenhum deles, entender algo. Sinto muito, mas além do tempo ser curto, a distância do festival já me impede de escrever muito mais, apesar de alguns filmes, merecerem isso.

Sobre os filmes

Dizem que os filmes selecionados em Gramado nunca dão campeões de bilheteria. Considerando essa edição, em particular, eu concordaria. Mas também, que festivais de Cinema dão?
Boa parte das pessoas com que tive contato lá, estavam um tanto divididas quanto a qualidade da mostra. De fato, eu diria que os longas nacionais estavam realmente irregulares. Os maiores acertos talvez tenham sido os dois documentários exibidos, fato não muito comum - e uma surpresa muito agradável. 
Já os longas estrangeiros (lê-se latino-americanos) estão mais que de parabéns. Boa parte deles já havia sido exibida no festival de Guadalaraja (AXN não é só ação, galera), com destaque para dois que haviam estado em Berlim, um dos maiores festivais de Cinema do mundo.   
De qualquer modo, sempre penso que só o fato de assistir a um filme já vale à pena. É claro que existem lá suas exceções, e também sou suspeito em falar, mas foi extremamente válido assistir cada uma das onze obras, sem contar com os curtas (perdí a conta de quantos foram).
[*]
Quando Sérgio Silva, o diretor de "Quase um Tango", longa que abriu a mostra competitiva, subiu ao palco, eu simpatizei com ele rápido. Ao menos pra mim, claramente ele se dedicou ao filme, foi um trabalho feito de coração. Ele queria se comunicar através dele. O que parece é que o sotaque de gaúcho do Marcos Palmeira, que interpreta o protagonista Batavo, não convenceu nem um pouco. Apesar de concordar com isso, acredito que ele tenha se esforçado no papel, sem saber que o resultado final seria esse. Aliás, falando em resultado final, o grande problema que Sérgio Silva encontrou foi justamente na direção da narrativa. Por algum motivo, quase tudo parece superficial na obra, e isso não se restringe só a sotaques.
[*]
"Canção de Baal" obteve aplausos um pouco tímidos quando as luzes acenderam. O público estava claramente dividido, e talvez perturbado também. Por mais que a direção de Helena Ignez seja bastante precisa, como bem observou meu chará e companheiro de júri Victor Rosa, a roupagem dadaística do longa afasta mais do que atrai. Quando o filme acabou, eu só lembrava do livro "Noites na Taverna" e na minha cabeça as palavras "dadaísmo cinematográfico" apareciam. Isso é ruim? Não sei. Não sei nem se essa minha interpretação está coerente. Mas se estivesse correta, eu diria então: dadaísmo cinematográfico, com tudo que isso tem de bom e ruim.
[*]
"Cildo" é um filme de um diretor jovem, mas que conseguiu transportar para a estética do documentário a alma da obra de Cildo Meireles; parece até que o longa foi dirigido pelo mesmo. Sem dúvidas é um filme competente, e já foi premiado por estar em Gramado.
[*]
Perdí o discurso do Vincent Carelli, quando o mesmo apresentava seu documentário (?). Mas nunca, em nenhum outro momento do festival, isso não fez tanta falta para conhecer um pouco do realizador de um filme. Quando se termina de assistir "Corumbiara", você se sente tão íntimo de Vincent, que a sua única vontade é lhe dar um grande abraço, por toda sua bravura, trabalho, força, ou qualquer outra palavra que sirva pra classificar algo glorioso. E foi o que houve, Vincent Carelli e Marcelo, o digamos "protagonista" de seu documentário, devem ter sido os caras mais abraçados de todo o festival (em segundo lugar, o elenco de Nochuebuena, que falarei mais adiante).
Não tenho palavras para falar sobre "Corumbiara". Ouví dizer que alguns críticos acharam que ele tinha mais de reportagem e pouco de Cinema. Entendo, respeito, pode até estar certo, mas eu não consigo concordar. "Corumbiara" (vou repetir esse nome mesmo, pra que ninguém esqueça) é o longa do festival que mais reúne elementos que compõe alguma obra de arte qualquer. Você não só sente a mão de seu autor, como entra em uma ligação com ele durante as duas horas de documentário. Uma ligação íntima, conforme disse, algo louvável para um documentário - mais louvável ainda, se fosse para uma reportagem. O filme tem uma alma brasileira, que, querendo-se, pode ser percebida facilmente. Uma alma brasileira e humilde, simples, assim como o povo.
Em nenhum momento Vincent cai na tentação de ser sensacionalista ou piegas, nem de botar lágrimas nos olhos do espectador. Mesmo assim, ouví dizer que muita gente chorou com o final do filme. Só do júri, acho que uns 3.
[*]
"Em teu nome" provavelmente foi o longa mais aplaudido do festival. Isso se dá por diversos motivos, como um forte bairrismo e também pela temática, sobre os efeitos da ditadura, mais precisamente, o exílio, que toca no espectador. Apesar disso, não se sente uma mão tão firme do realizador durante o filme, e o que vemos é uma chuva de fade-outs que atrapalha um pouco, além de também uma falta de costura melhor entre as cenas.
Ainda assim, na última imagem, quando entra na tela as pessoas reais que deram inspiração aos personagens do filme, eu também sentí uma fisgada. E, independente de quaisquer problemas técnicos-narrativos, o filme emocionou muita gente. Acho que isso faz parte da magia do Cinema. É o que importa.
[*]
Por fim, "Corpos Celestes", um dos mais aguardados filmes dessa 37ª edição de Gramado. O nome de Marcos Jorge ("Estômago") prometia bastante, e o currículo de Fernando Severo, também. Contudo, tive a impressão que o longa não se decidiu sobre o que era. Os diretores e roteiristas pareciam não saber muito bem à o quê dar atenção, e sobre o que era a história. No fim, essa foi minha sensação: assisti a um filme sem saber exatamente que história ele queria contar. Claro que alguns defendem que Cinema não é só a história que se conta (e não é mesmo), mas quando se conta duas ao mesmo tempo, precisamos saber qual delas é a principal e qual não é, até mesmo pra saber quando e como terminá-las. Curiosamente, saí do Cinema com a impressão de que era um filme à se ver de novo...

Gramado

Foi com certa descrença que aceitei participar do concurso do Jornal do Brasil. Com certeza vou dever ao Thiago pelo resto da minha vida, já que ele praticamente me empurrou na tal promoção. Se eu tivesse visto, é quase certo que sequer tentasse. Nunca tinha ganhado nada do tipo antes, e só me imaginava em Gramado daqui há alguns anos, de preferência, com um (bom) filme, já que lá é um dos grandes festivais de Cinema do país e da América Latina. Acabou que um pequeno texto sobre o belo filme "Deserto Feliz" e o Thiago, me levaram até lá. Ah, e é claro, o JB também.
Fora uma turbulência mínima no vôo de volta - pra quem não está acostumado, qualquer treme-treme é caos - a viagem foi indescritivelmente boa. Não só pelo contato diário e intenso com o Cinema, mas também por tudo que foi vivido lá, não só por mim, mas como por todos os companheiros de júri e também cineastas que se cruzaram por lá. Não fosse Gramado, dificilmente eu estaria escrevendo em um blog, algo que eu sempre me senti incapaz - nada pessoal, mas meu recorde em blogs é de três postagens/ano. Por causa de alguns amigos que dividiram a missão de ser jurado comigo, cheguei a conclusão que esse seria um bom espaço pra expressar opiniões sobre momentos como esse.  Valeu Júlia e Victor (não é esse que tá escrevendo não, é outro, mais conhecido como "Floripa"). Aliás, o estopim foi ver hoje o blog de uma amiga querida, a Luar, e perceber que alguém pode sobreviver escrevendo 4 vezes num blog ao longo do ano. Agora não vou ficar mais com a consciência pesada.
[*]
Eu moro no Rio há 19 anos e vergonhosamente nunca fui ao Festival do Rio, por diversos motivos, sejam eles de tempo, financeiros ou outros. Mas ainda assim, desconfio que o festival da minha cidade seja bastante diferente de Gramado. Não melhor nem pior, simplesmente diferente. Aqui os filmes passam em salas de Cinema diferentes, em vários lugares da cidade e em dias diferentes; lá, é basicamente em um lugar, que eles chamam de Palácio. A condição de cidade turística de Gramado favorece bastante pra que essa diferença se acentue. Lá, o lugar simplesmente respira o festival; a cidade se vira inteiramente ao Festival de Cinema. O mesmo, infelizmente e por várias razões, não acontece aqui. Talvez por isso, um evento como esses represente mais o que é a experiência de estar em um festival de Cinema. É claro que o tapete vermelho ajuda, mas isso é outra história...